Foram registrados 176 casos de importunação sexual no Rio Grande do Norte, no período de 1 de janeiro a 30 junho de 2022, de acordo com dados da Polícia Civil. Em comparação com o mesmo período de 2021, foram registrados 89 casos, num crescimento de 97,8%. Ainda de acordo com o levantamento, são crianças e adolescentes de 12 a 17 anos de idade as vítimas mais comuns. Nessa faixa etária, houve aumento de 213,3% no número de casos, usando os mesmos parâmetros de tempo. Crianças de 0 a 11 anos também são vítimas recorrentes. Com elas, os casos saltaram de 6 para 15 registros. Em geral, não há um único padrão no perfil das vítimas, já que há também aumento entre pessoas de até 64 anos.
De acordo com a delegada da Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (DEAM), Ana Paula Pinheiro, as denúncias chegam de duas formas. Divididas entre flagrante e através de Boletim de Ocorrência feito presencialmente ou através do disque denúncia. “O acusado é pego no momento que está praticando aquele ato de cunho sexual ou ele acabou de cometer e a Polícia Militar foi acionada, conseguiram prender e o levaram para a delegacia, ou então quando a vítima registra um boletim de ocorrência se referindo a uma situação que aconteceu no passado”, explica. Ela conta, também, que, no momento da denúncia, a vítima reúne provas e a delegacia começa a investigação. “Ela [a vítima] vai, registra a ocorrência e, a partir das declarações e dos instrumentos de prova que ela conseguir juntar, e que a gente consiga também coletar ao longo da investigação, a gente instaura o inquérito policial que vai investigar esses fatos”, continua.
Apesar de haver aumento de registro de casos entre crianças e adolescentes, a delegada pontua que não há perfil específico para as vítimas. De acordo com ela, o criminoso chega a observar o comportamento de alguém e então resolve agir. “Não existe um perfil específico da vítima, o agressor espera a oportunidade de agir. Alguma das vezes ele já estava observando a vítima, o comportamento dela, estava esperando um momento para estar a sós, ou então acontece em lugares de grande circulação de pessoas”, disse. Ela conta, também, que lugares de maior circulação de pessoas podem ser ambientes para a agressão. “Shoppings, dentro dos ônibus, em ambientes de maior circulação. Eles podem acontecer em qualquer lugar, e a vítima pode ser qualquer pessoa”, ressalta.
Um lugar apertado, ninguém sabe bem quem está passando. O ambiente “ideal” para mascarar o agressor. Dessa forma, a vítima continua a vida com medo e precisando estar sempre alerta. A realidade de muitas mulheres brasileiras. “Eu vejo com que roupa que eu estou e o horário. Eu sei que às vezes, quando acontece alguma coisa assim, eles culpam a gente que é mulher”, explica a estudante Karoliny da Silva, de 21 anos. “No ônibus, eu procuro não ir em pé perto de homens. Tem homem que, quando o ônibus está cheio, fica aproveitando para ficar ali, toda hora encostando em você. A gente que é mulher se sente mais segura perto de mulheres”, conclui.
Ônibus
Elilson Ramos de Medeiros, de 54 anos, foi preso após importunar sexualmente uma mulher dentro de ônibus da linha 121 para Extremoz. O caso aconteceu na última segunda-feira (8) e foi registrado em vídeo pela própria vítima, que percebeu a movimentação suspeita e resolveu gravar com o celular. Ele foi preso em flagrante e submetido a uma audiência de custódia, que resultou na aplicação de medidas cautelares. Sendo assim, ele está impedido de aproximar-se ou entrar em contato por qualquer meio com a vítima e seus familiares, foi submetido a recolhimento domiciliar no período noturno, é obrigado a fazer uso de tornozeleira eletrônica e a comparecer aos atos processuais. Além disso, precisa pagar uma fiança no valor de meio salário mínimo.
Para denunciar, a vítima pode comparecer à delegacia para registrar a ocorrência que, segundo a delegada Ana Paula Pinheiro, é a forma mais eficaz. “Essa é a que a gente mais orienta porque a gente entende que é a mais eficaz, a mais eficiente. Porque no exato momento que ela registra a ocorrência, ela já é ouvida, ela já é orientada a juntar as provas, ela já é levada para os exames de praxe”, explica. No momento da denúncia, o Boletim de Ocorrência é aberto, a vítima e possíveis testemunhas são ouvidas, levantamento de outras provas é feito – que podem ser fotos, vídeos – , além da confecção de exames periciais.
O Disque 180 também é um canal de denúncias de fácil acesso. Em caso de flagrante, é preferível o acionamento da Polícia Militar para efetuar a prisão através do 190.
No Brasil, os dados são preocupantes
Em levantamento feito pelo Instituto Datafolha, no primeiro semestre de 2021, 26,5 milhões de mulheres relataram ter sofrido importunação sexual. À medida que os casos aparecem, campanhas surgem por meio de órgãos públicos para tentar resolver a situação. É o caso do movimento “Não é não no São João”, estabelecido este ano em João Pessoa, na Paraíba, palco para uma das maiores festividades juninas do país.
A ação foi lançada por meio da Secretaria Extraordinária de Políticas Públicas para as Mulheres (SEPPM) e teve a intenção de prevenir e coibir crimes de importunação sexual e violência de gênero, principalmente durante as festividades. Outra campanha que tem força no país é o #CarnavalSemAssédio, que acontece no período de festividades carnavalescas em fevereiro e março, em todo o país. A ação é independente, promovida pelos movimentos “Vamos Juntas?”
O Projeto de Lei nº 3863/2021 está em tramitação na Câmara dos Deputados. A intenção é obrigar a administração pública a divulgar informações sobre o crime de importunação sexual em veículos e terminais de transporte coletivo. O projeto será analisado pelas comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, de acordo com informações da Agência Câmara de Notícias.
Lei
A Lei nº 13.718 de Importunação Sexual entrou em vigor há pouco mais de três anos, no dia 24 de setembro de 2018. O crime prevê pena de uma a cinco anos de reclusão. De acordo com ela, pode ser considerado importunação qualquer ato libidinoso de caráter sexual na presença de alguém, sem sua autorização, na intenção de satisfazer seu próprio prazer sexual ou de outra pessoa. Práticas como apalpar, tocar, masturbar-se ou ejacular em público se enquadram. Antes do surgimento da lei específica, o crime era enquadrado na Lei de Contravenção Penal, que trata de importunação ofensiva ao pudor. Também são enquadrados casos de divulgação de cena de estupro ou de estupro de vulnerável, bem como cenas de sexo ou pornografia, ou seja, “oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia”, é considerado importunação, de acordo com o Código Penal.