Desde agosto de 2020, três mulheres, mesmo que sem perceber de início, acabaram marcando a história do setor elétrico potiguar. Rosana, Raquel e Lioneide fizeram parte da primeira leva de mulheres eletricistas contratadas pela Neoenergia Cosern, criando espaço para a mudança em uma profissão completamente associada à atuação masculina. Os desafios são muitos, mas ao contar um pouco sobre suas trajetórias, o sentimento de realização transborda nas palavras de cada uma.
Rosana de Oliveira trabalhava como microempreendedora no ramo de bonés personalizados em Mossoró. Após se inscrever na Escola de Eletricistas em 2019, iniciativa da empresa em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), passou a se dedicar totalmente à mudança de área com bastante entusiasmo. Um ano depois, Rosana se tornou a primeira mulher a compor o quadro de eletricistas nos 60 anos de Neoenergia Cosern e sonha em um dia evoluir para a Engenharia.
“Por ser uma profissão com atuação predominantemente masculina, me bateu uma curiosidade de saber como seria atuar nessa área como mulher. Fui conhecendo todo o processo e hoje eu sou apaixonada pelo que faço como eletricista de linhas e redes de distribuição. É muito gratificante trabalhar no dia a dia, conviver com pessoas que tiveram a mesma história que eu. Costumo dizer que nós levamos energia para o mundo. Você chega na residência e as mulheres se sentem representadas por nós. As vezes, pedem para tirar fotos e registram como forma de incentivo para as filhas e colegas”, afirma.
O dia de trabalho é bem árduo, com atividades de campo independente de sol ou chuva. Elas chegam cedo, organizam suas viaturas, e partem para um diálogo diário de segurança com a equipe. Depois desse momento, saem para campo, realizando ligação de novas unidades consumidoras, até mesmo corte de energia por inadimplência, inspeções na rede e emendas de cabos quando ocorrem quedas de árvores ou chuvas mais torrenciais.
Raquel Macedo, com apenas 24 anos, já foi aprendiz, estagiária e agora é eletricista da Neoenergia Cosern. Com formação em Eletrotécnica, aproveitou a oportunidade da Escola de Eletricistas para retornar ao local. “Fui premiada em fazer parte dessa história de mulheres eletricistas. Durante o curso, tivemos todo o apoio e formação necessária. É uma realização muito grande ser uma das primeiras mulheres eletricistas do Nordeste. Só felicidade em ser reconhecida pelo trabalho, me sinto importante pelo que faço”.
Ao compartilhar sua vida nas redes sociais, Raquel conta que a profissão sempre gera surpresa e inúmeras perguntas, ‘Você é eletricista mesmo? ‘Mas você sobe no poste?’ sendo os questionamentos mais comuns. Mesmo na sua família, quando compartilhou a novidade de sua contratação, muitos só acreditaram quando a encontraram em atividade na rua. “É desafiador, todo dia é um novo dia. Precisamos de uma boa preparação física mas, mesmo assim, tem momentos que nosso corpo cansa. Atuamos com toda a segurança e preparação, só vamos para campo se estivermos bem. Quando recebo um elogio, aquilo deixa o coração cheio. É uma força para continuar”, diz.
Bacharel em Direito, Lioneide Lima ficou sabendo da oportunidade pela televisão e decidiu se inscrever no processo seletivo da Escola. “Mudei totalmente de rumo, quando me perguntam eu sempre digo que sou eletricista com amor. Sou muito de desafios e, por ser uma profissão antes ocupada só por homens, eu me vi na mudança e quis fazer parte. Não vou dizer que o trabalho é fácil, mas com preparação e prática, a rotina se torna mais tranquila”.
Para ela, a adaptação na empresa foi algo natural. Depois de um mês de treinamento prático, elas foram para campo. As atividades diárias são conduzidas segundo as orientações do supervisor, acompanhadas por um parceiro de equipe veterano e com uso dos equipamentos de segurança necessários. Mãe de Miguel e Fernanda, com 7 e 11 anos respectivamente, Lioneide fala que sua maior realização vem do orgulho que seus filhos sentem em ter uma mãe eletricista.
“Pelo fato de eu ter 36 anos, ter dois filhos, ser bacharel em Direito, quando a minha filha fala com orgulho para as pessoas ‘minha mãe é eletricista’, isso para mim é tudo. Eu poderia estar em outro lugar com a minha formação mas sou muito grata de trabalhar aqui e no final do dia é isso que conta. Trabalhar com alegria e se sentir bem aonde você está é o que vale. De que adianta ter tudo e não ser feliz?”, finaliza.
Igualdade de gênero é pauta social importante
Em 60 anos, o quadro de eletricistas da Neonergia Cosern nunca esteve tão diverso. Através da Escola de Eletricistas, 49 mulheres potiguares já foram formadas para atuar na profissão desde 2020. Atualmente, a empresa conta com 22 eletricistas na sua equipe de trabalho e duas novas turmas serão iniciadas em março, com inscrições encerradas e alunas já selecionadas para o curso.
O ingresso das novas profissionais faz parte da política interna de igualdade de gênero, em conformidade com os objetivos de desenvolvimento sustentável recomendados pela ONU. Segundo Isabelle Marques, consultora de Recursos Humanos, a iniciativa é compromisso do grupo Neoenergia como um todo. “Percebemos o quanto essa oportunidade está sendo importante para as profissionais e para a própria empresa. Esperamos que as mulheres ocupem esses postos cada vez mais”.
Em 2019, a Escola de Eletricistas passou a contar com a participação de mulheres pela primeira vez. Somente em 2020, 394 alunas e alunos concluíram o curso e 1.583 iniciaram as aulas nos cinco estados onde a Neoenergia atua por meio das suas distribuidoras. Para 2021, outras turmas estão planejadas com a participação de mais 675 estudantes. “A iniciativa foi fruto de uma grande divulgação que fizemos para captar esse público feminino que tinha interesse e perfil para trabalhar como eletricista. Nossa vontade, inclusive, é de formar uma turma só de mulheres. Não procuramos um perfil específico mas existem requisitos, notamos que o principal diferencial é o querer”, explica a consultora.
O curso oferecido em parceria com o Senai é gratuito e aberto a candidatos de qualquer gênero que tenham concluído o Ensino Médio ou equivalente. Para serem aptas, as candidatas precisam ter no mínimo 18 anos na data de inscrição e possuir carteira de habilitação definitiva B, C ou D. O processo seletivo conta com várias etapas que incluem teste de conhecimentos gerais, redação, avaliação psicológica, entre outras fases. Após a conclusão do curso, os formandos passam a compor o “Banco de Eletricistas” da empresa para possíveis oportunidades de trabalho.
Daniel Burgos atua como supervisor de operações da Neoenergia Cosern e é chefe direto das contratadas. O engenheiro avalia que a participação feminina é uma quebra de paradigmas no setor. “Esse processo, de início, foi muito desafiador porque passamos por uma série de dificuldades que não imaginávamos. Uma situação que nunca pensamos, por exemplo, foi a questão da luva de trabalho e o tamanho das mãos das mulheres. Precisamos buscar itens adequados no Brasil inteiro e o mercado não estava preparado para isso”.
“Quando começamos a colocar em linha todas essas particularidades, até mesmo do corpo feminino, precisamos fazer alguns ajustes para adaptar nossos protocolos. Depois dessas dificuldades superadas, o tratamento é absolutamente igual a qualquer homem na profissão de eletricista. Conseguimos fazer a operação com o mesmo padrão de qualidade, mesma eficiência e produtividade. Para mim, o que elas trazem de positivo para o campo são, especialmente, o zelo e a qualidade do atendimento”, diz o supervisor.