O Exame Nacional do Ensino Médio deve ter um novo formato a partir de 2024, com questões discursivas e uma segunda etapa focada em áreas escolhidas pelo aluno. As mudanças foram aprovados nesta segunda-feira (14) em um parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) e ainda precisam de decisão final por parte Ministério da Educação (MEC). Em Natal, escolas e cursos privados já se preparam para lidar com os novos desafios.
O formato deve acompanhar as mudanças propostas pelo modelo do novo ensino médio, que já começou a ser implementado neste ano para alunos da 1ª série. Por meio de nota, o MEC esclareceu que as atualizações do novo Enem são objeto de discussão, desde dezembro de 2021, de um Grupo de Trabalho que possui representantes da sociedade civil e de órgãos como o CNE e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
“A decisão sobre o novo Enem somente ocorrerá após a conclusão desse Grupo de Trabalho e será amplamente divulgada à sociedade. O novo formato materializa as diretrizes legais da reforma do Ensino Médio, já em vigor, e da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Sua atualização será fundamental para garantir aos entes federativos e as instituições privadas de ensino maior segurança na implementação do Novo Ensino Médio”, informa o Ministério.
O novo formato poderá ser realizado em duas etapas. A primeira contará com a redação e perguntas de formação geral sem divisão por disciplina. Na segunda etapa, é possível que haja questões discursivas visto que a recomendação do CNE é que o estudante escolha as provas que fará de acordo com a área vinculada ao curso superior que pretende cursar.
Em Natal, o CEI Romualdo/Roberto Freire encara o desafio com tranquilidade. Segundo Fabiana Reis, orientadora educacional do ensino médio na instituição, as mudanças promovidas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) já são alvo de estudo do colégio há muitos anos, estudo esse que foi intensificado após a homologação do novo ensino médio em 2018. “Percebemos as mudanças como favoráveis pois a partir do momento que se considera os itinerários formativos no Enem, isso mais uma vez reforça a perspectiva de um caminho escolhido pelo aluno. Eles vão fazer um percurso de aprendizado em um caminho que escolheram”, diz.
No colégio, as mudanças referentes ao novo ensino médio já estão sendo implementadas desde o ano passado, quando os alunos da atual 1ª série foram preparados ainda no ensino fundamental II para as vivências esperadas. “Não vejo nenhum prejuízo para os alunos, pelo contrário, até mesmo porque a escola já trabalha com questões discursivas há muito tempo. Para o aluno do CEI, não vai haver dificuldade nesse sentido porque no percurso de aprendizagem ele já se depara com questões discursivas e estratégias de respostas”, diz Fabiana.
Natália Santiago, aluna da 1ª série no Nosso CEI, comenta que ainda está um pouco insegura com a notícia. “Ainda não sabemos exatamente como será o formato do Exame mas acredito que os estudos serão bem mais direcionados. Vejo as mudanças como algo positivo, pois agora resolveremos os problemas das questões focados em situações do dia a dia, aplicando o conhecimento adquirido principalmente nos itinerários formativos e eletivas. Adaptei minha rotina com a ajuda da psicóloga escolar para conseguir fazer revisões semanais e absorver melhor o conteúdo”, relata a estudante.
Preocupação
Para Marcus Demétrios, professor da Rede Expansivo e especialista em gestão pública, por ainda não ser possível mensurar a eficiência do novo ensino médio, o Novo Enem pode ser um tiro no escuro. “Essas primeiras implementações começaram a entrar em campo há pouco tempo e nós ainda não conseguimos mensurar a eficiência desse novo modelo. Não sabemos se por exemplo, vamos conseguir corrigir o IDEB, índice que leva em consideração o desempenho acadêmico dos nossos alunos”.
“Essa nova proposta de Enem traz uma grande responsabilidade para a comunidade escolar. Não conseguimos ainda mensurar com dados os pontos positivos, algo muito preocupante porque não podemos trabalhar no senso comum. Temos que apresentar dados para avaliar uma política desse tipo. A educação é uma política que requer, sobretudo, muito planejamento a longo prazo para que você consiga gerar resultados efetivos”, argumenta o especialista.
Marcus reforça que o modelo atual do exame precisa de melhorias mas que é preciso tempo e planejamento para implementação. Mudanças repentinas podem, por exemplo, agravar a desigualdade entre o ensino público e privado já existente no país. “Sou um otimista e verdadeiramente acredito na educação como uma política pública libertadora, agora isso é um processo longo, não é a curto nem médio prazo. A educação pública no Brasil sempre foi um processo de grande desigualdade, e acredito que superaremos essa situação mas a mudança muito repentina, sem um planejamento eficiente, pode ser uma mola para o aumento dessa disparidade”, finaliza.
Cursinhos enxergam o formato como positivo
O diretor e professor do Over Colégio e Curso vê a proposta do Novo Enem como algo extremamente positivo. Em entrevista à reportagem, Carlos André elencou alguns motivos para justificar sua posição. “Apesar da prova do Enem ser bem-feita e moderna, não há nada tão perfeito que não possa ser evoluído. A ideia atual do Enem gerou alguns problemas que eu considero pedagógicos e até mesmo sociais. Quando o aluno se inscreve no Enem, não é obrigado a escolher o curso dele, nem mesmo a área. Esse excesso de liberdade, na minha opinião, induz muitos problemas. Por exemplo, se um aluno queria passar para Direito e de repente muda para Física, a probabilidade de uma mudança dessa dar certo é ínfima”.
Carlos também ressalta que o modelo é consequência natural da reforma do ensino médio que começou a ser implementada em 2022, uma atualização que se espera há décadas. “O ensino brasileiro é focado em quantidade, muito conteúdo e pouco aprendizado. Desse modo, a reforma do ensino médio visa enxugar os conteúdos e dar protagonismo ao estudante para escolher as disciplinas que vai estudar de acordo com seus interesses futuros. Se o formato da escola vai mudar, a prova do Enem tem que mudar. Em um exemplo muito prático, os alunos que se preparam para o Enem, estudam muito mais matemática do que Biologia. Não faz sentido. O formato novo do ensino médio precisa de uma prova adaptada”, finaliza.
No CDF Colégio e Curso, tanto o coordenador Igor Berício quanto o diretor Carlos Henrique apontam pontos positivos sobre o novo modelo. “Hoje, o aluno não foca no que ele quer. Se perguntamos que curso ou área um estudante almeja, muitos falam que estão estudando para passar no Enem, ou seja, o curso que der para encaixar a nota, ele vai entrar. Já com essa mudança em 2024, vai ser diferente porque a prova discursiva pode ser específica para sua área, demandando uma atenção maior já para a área de interesse”, argumenta Igor. Carlos Henrique relembra que a mudança não é estranha no Rio Grande do Norte pois volta a lógica do antigo vestibular. “Em 2012, quando foi o último vestibular da UFRN, era uma prova objetiva e outra discursiva, onde o aluno escolhia aquela área de mais habilidade. Infelizmente, isso é algo que o Enem atual não faz. Matemática e Redação são as disciplinas que definem vagas em cursos que nem vão precisar tanto desse conhecimento. O aluno que quer cursar Direito precisa estudar muito Matemática, algo que não vai ser exigido ao longo do curso. Temos um aluno que foi aprovado em Direito onde a maior nota dele foi Matemática e a menor foi em Ciências Humanas, é um contraste muito grande”, comenta.